Este trabalho nasceu de um estudo sobre as relações entre a Escola de Franckfurt e o Movimento de Contracultura. Perguntávamo-nos na época sobre como a contracultura influenciou as artes plásticas? E qual a maneira que o Terceiro Mundo, no caso o Brasil, poderia reproduzir um movimento que era a expressão de crise da sociedade industrial? Correlatos a estes temas tínhamos outros: a questão do pós-modernismo, a perspectiva libertária da descentralização contida na contracultura e, por último, a influência orientalista também presente no movimento contracultural. Sobre estas preocupações desenvolveu-se este trabalho, centrado mais nas primeiras questões. Como grande parte dele foi escrito quando de uma estada na Califórnia – EUA, a perspectiva estudada centrou-se em duas realidades sócio-culturais e geográficas: EUA e Brasil. E, apesar da pequena extensão desta monografia, temos consciência de que, face à complexidade e vastidão do tema, apenas iniciamos um caminho, esboçamos uma visão e abrimos o debate.
1 – O que é cultura?
A palavra cultura origina-se do Latim (cultúra, cultús), significando de um lado o ato de cultivar, e de outro o de prestar culto a alguma divindade. Sabemos que a civilização em seus estágios iniciais não separa o plantar o alimento no culto a divindades identificadas com a natureza (a terra, a chuva, o sol, o rio), o que dá um sentido unitário ao conceito de cultura. Hoje, contemporaneamente falando, cultura diz respeito a toda produção humana surgida da realidade social, supõe, como afirma José Luiz dos Santos: “… tudo aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação, ou então de grupos no interior de uma sociedade[1]“. A partir desta definição, cultura é uma realidade múltipla, podendo existir distintas formas de cultura. Porém, alerta José dos Santos que cultura pode dizer respeito também mais especificamente: “… ao conhecimento, às idéias e crenças, assim como às maneiras como eles existem na vida social[2]“. Esta segunda concepção leva-nos à idéia de que, se a cultura diz respeito também a um só domínio da vida social, podem coexistir numa mesma sociedade várias formas de cultura. Daí a idéia de que uma cultura alternativa pode romper com os valores tradicionalmente respeitados na “cultura oficial”, o que nos conduz ao conceito de contracultura.
2 – O que é contracultura?
2.1 — Suas origens
A contracultura nasce, em primeira instância, da constatação da dinamicidade histórica da cultura que, por ser mutável e criação constante e livre, admire uma pluralidade avessa à idéia de algo único, irretocável e conservado por herança através da tradição e da educação. A contracultura surgiu da crise e da doença da cultura estabelecida, e supõe a superação do preconceito de que, o que está consagrado e vigindo é melhor do que o que possa surgir, haver existido ou estar marginalizado em relação à cultura oficial. A contracultura é um cadinho de aspectos dissidentes da cultura estabelecida, onde aglutinaram-se considerações econômicas, políticas, filosóficas, científicas e sociais. Em princípio, a contracultura surge como um fenômeno próprio das sociedades superdesenvolvidas, como uma reação social de contestação diante da abundância.
Segundo Herbert Marcuse, a “grande rejeição” à sociedade industrial avançada é uma contestação que ultrapassa a política e recusa a “civilização”, considerada globalmente, de modo a buscar na prática formas de rompimento com a cultura estabelecida. A teoria de Marcuse retoma Freud refutando-o em parte. Dentro do freudismo a civilização é incompatível com a felicidade, tomada então como a satisfação dos instintos, daí a idéia de que as pulsões reprimidas necessitam ser sublimadas para encontrar manifestações socialmente permissíveis. Marcuse então retoma de Reich a tese de que a felicidade e a liberdade do indivíduo exigem uma transformação radical da sociedade, onde não tenha mais lugar a repressão. Concebe Marcuse que a sociedade industrial é super-repressiva pelas restrições inúteis que impõe ao indivíduo no contexto social, mas que é hoje possível uma sociedade não repressiva, devido ma que, com o superdesenvolvimento e a abundância, a repressão pode se tornar supérflua. Escreve Schwartzenberg, tratando de Marcuse:
“A sociedade industrial avançada possui os recursos, os meios necessários para abolir a ‘escravidão’, para diminuir largamente a duração do trabalho, para dar a seus membros o tempo de viver sem reprimir os seus instintos”[3].
Para que tal transformação seja possível, necessário se faz que se destrua a ideologia da sociedade industrial, que criando necessidades artificiais escraviza o homem na relação de produção-consumo. Para Marcuse, a sociedade industrial torna inconsciente a perda da própria identidade, o homem aliena-se de tal modo que a contestação desaparece, absorvida que é pela “ideologia única da sociedade”. O indivíduo não consegue mais ter ideais superiores, e mesmo o proletariado, sem uma cultura própria, passa a reivindicar apenas quantitativamente, tentando ascender no sistema sem questioná-lo ou tentar mudá-lo.
Daí que, para Marcuse, o proletariado unido à burguesia numa ideologia única, deixa de ser revolucionário, abrindo espaço a outras forças: os marginais da sociedade de consumo que ainda são capazes de imaginação. São eles as minorias desfavorecidas da sociedade industrial, sejam étnicas ou nacionais, econômicas, sexuais ou políticas. O proletariado das economias desenvolvidas será força revolucionária só se for despertado de seu sono alienado por estas minorias. Apesar de que, no Terceiro Mundo, o proletariado mantém-se como força revolucionária independentemente de catalisadores externos, devido à forte exploração econômica a que estão ainda submetidos. Para Marcuse a luta de classe é substituída na sociedade do homem unidimensional pelo conflito de gerações, porque são os jovens os marginais sociais majoritários, aqueles que possuem a força de fazer uma revolução cultural: a contracultura. Theodore Roszak sintetiza as influências filosóficas que resultaram na contracultura, quando escreve:
“One can discern, a continuum of thought and experience among tehe yong which links together the New Life sociology of Mills, the Freudian Marxismo f Herbert Marcuse, the Gestalt-therapy anrchism of Paul Goodman, the apocalyptic body misticismo f Norman Brown, the Zen-based psychotherapy of Alan Watts, and finally Thimothy Learys’s impenetrably occult narcissism, where in the world and its woes may shrink at last to the size of a mote in one’s private psychedelic void. As we move along the continuum, we find sociology giving way steadily to psychology, political collectivities yielding to the person, conscious and articulate behavior falling away before the forces of the non-intellective deep”[4].
2.2. – Dois sentidos de contracultura
Escreveu Luiz Carlos Maciel:
“Pode-se entender contracultura, a palavra, de duas maneiras:
- como um fenômeno histórico concreto e particular, cuja origem pode ser localizada nos anos 60; e
- como uma postura, ou até uma posição, em face da cultura convencional, de crítica radical;
- no primeiro sentido, a contracultura não é, só foi; no segundo, foi, e certamente, será”[5].
No primeiro sentido, podemos elaborar a história do movimento contracultural, que se deu originariamente nos países desenvolvidos e iniciou-se primordialmente no oeste dos EUA. O outro sentido nos permite ultrapassar os limites geográficos e históricos da contracultura, e até mesmo encontrá-la manifesta em movimentos culturais de países ocidentais do terceiro Mundo, onde particularmente tentaremos situar o Brasil.
No momento em que entendemos, com Gramsci, que antes de buscar o confronto direto com o poder da classe dominante cristalizado no Estado, tentando mudar primordialmente a infra-estrutura social, cabe-nos muito mais é a busca de uma revolução cultural em que consigamos tornar hegemônicas as produções e valores da classe dominada, neste momento estaremos a um passo da concepção marcuseana e da contracultura no segundo sentido. Porque, se para Gramsci co-existem duas culturas numa mesma sociedade (uma dominante e a outra sufocada), para Marcuse asfixia foi de tal ordem que existe hoje, em nível das classes sociais, apenas a cultura dominante. O proletariado assumiu os valores da burguesia, deixou de ser força revolucionária, sonha em subir na vida e viver aburguesadamente. Porém, restam as minorias desfavorecidas, que não havendo ainda compactuado com o poder dominante, preservam nos seus valores uma oposição ao que está estabelecido, se configurando como autêntica força revolucionária. Esta oposição à cultura ocidental vigente chamou-se contracultura. E nela a arte desempenha um papel fundamental, assumindo, segundo Marcuse, o “avesso da realidade”. A arte possui intrinsecamente uma força revolucionária de contestação e subversão, entendendo-se que a crítica à cultura estabelecida pode se dar através do belo, do harmônico e até mesmo da flor e do amor, como o fez o movimento hippie.
3 – A contracultura nos EUA: beats e hippies
Na década de 50, nos EUA, um punhado de jovens escritores e poetas americanos deflagraram um movimento que levou o nome de “beat”, e que foi simultaneamente, uma revolução literária, o depoimento de uma geração e a explosão criativa de um outro modo de sentir, pensar e viver a vida. Os grandes expoentes literários deste movimento foram: Jack Kerouac, Gregory Corso, Allen Ginsberg, Lawrence Ferlinghetti, William Burroughs, Neal Cassady, Peter Orlovsky e Gary Snyder. Literariamente o beat caracterizou-se pela ousadia criativa, pela imagem informal, baseada na fala popular, pela atitude anti-intelectual e anti-acadêmica, aliada a uma concepção de literatura não divorciada da vida. E a geração beat viveu transgredindo as leis e a moral vigentes, buscando uma certa transcendência e um certo autoconhecimento, a realização interior, o que incluía o uso de drogas, o nomadismo aventureiro e, em alguns casos, o homossexualismo publicamente assumido.
Do termo beat surge o cognome beatnik, criado por um jornalista de San Francisco, talvez lembrando o satélite sputinik lançado pela URSS. A palavra beatnik passou a designar os jovens marginais, boêmios e excêntricos da época, chamados no Brasil de juventude transviada, expressão extraída de um filme com James Dean.
A palavra beat provavelmente tem ligação com a batida do jazz, apesar de os escritores do movimento não a associarem ao verbo bater. Diz Kerouac: beat significa beatitude”[6].
Porém, a improvisação do jazz está presente não só na música, mas no Living Theatre, no Action Painting de Jackson Pollock, e de outro, como tema literário. Kerouac gravou em fita ao som de jazz um papo com Neal, que faz parte do livro Visions of Cody. Surgiu então a fusão beat-pop, em que se une a música e a poesia. Ao final dos anos 50 se fazia nos EUA sessões de jazz-poetry, em que um músico fazia anotações musicais sobre um poema, que era depois recitado ao som de jazz.
Quando os negros americanos tomaram consciência da exploração a que estavam submetidos e começaram a reivindicar, surgiu o rock, que conseguiu a buscada fusão entre palavra e som. Elvis Presley mostrou que os brancos podiam incorporar o rock e se rebelar.
O Rock and Roll, devido a sua “pobreza” musical e por ser essencialmente ritmo, buscou enriquecer unindo-se a outras formas musicais. Surge o hard rock, o rock blues, o country rock, usa-se letras românticas e políticas, a melodia se torna quase erudita, quase oriental, quase latina, experimental, etc. Esta trajetória passou por vários nomes: Bob Dylan, Johan Baez, James Taylor, Simon and Garfunkel, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Pink Floyd, The Rolling Stones e os Beatles. Estes deram ao rock uma dimensão mundial e divulgaram o comportamento rebelde e pacifista (Elvis lutara na guerra), as drogas (da maconha ao LSD) e o orientalismo (pelas viagens que fizeram à Índia, para encontrar o guru Maharishi). Aconteceu Hair e Woodstock. Morreram Janis Joplin e Jimi Hendrix. Já era então época dos hippies, que acrescentaram ao movimento beat além do pacifismo e orientalismo, o anarquismo e a liberdade sexual, trazendo cores ao quadro preto e branco da geração beat.
Apesar da bandeira pacifista ter conotações contestatórias, antipatrióticas, e estar associada às doutrinas de não-cooperação e desobediência civil de Thoureau, Gandhi e Luther King, os hippies assumiram cada vez mais uma postura antipolítica. Se os primeiros hippies tinham uma forte consciência política, logo o pacifismo degenerou em passividade, talvez devido ao ócio provocado pela atitude contemplativa proporcionada pelas drogas, pela liberação sexual e pelas comunidades rurais. Pois os alucinógenos, acrescidos pelos hippiesàs drogas da geração beat, afastaram ainda mais os jovens de um compromisso maior com uma transformação da realidade social.
Os hippies tiveram um pé no anarquismo porque eram críticos do capitalismo e da sociedade de consumo e, simultaneamente, avessos ao autoritarismo (não tiveram chefes) e à militância político-partidária. Opuseram-se também à religião tradicional, buscando alternativas filosófico-religiosas no Oriente: budismo zen (meditação), hinduísmo (yoga), I-Ching, taoísmo, etc. Mas caíram no individualismo e no subjetivismo, segundo Herbert Marcuse por “professarem um anti-autoritarismo abstrato, que desprezava a teoria em nome da prática, e ao ritualizarem e fetichizarem o marxismo”[7], perdendo impacto político e se autodestruindo na ‘liberação” individual.
Entretanto, sabemos que os hippies foram mais vítimas que suicidas, foram devorados pelo stablishment: o artesanato virou indústria, a roupa colorida originou a moda jovem, o rock é hoje investimento milionário, as comunidades rurais fracassaram ou transformaram-se em fazendas-empresas, o orientalismo perdeu seu apelo contestatório e Maio de 68 na França não resultou em nada. John Lennon disse: “o sonho acabou”, e em Berkeley surgiram os yuppies, uma versão política dos hippies que não vingou. É claro que hoje existe uma maior liberdade sexual, o movimento pacifista sobreviveu aos hippies e só se esvaiu com o fim da guerra do Vietnã e com a Perestróica. Os Partidos Verdes são herdeiros desta época, ecologia hoje é preocupação mundial. E o que restou do naturismo e do orientalismo transformou-se em proposta séria, cada vez mais longe do modismo ou da prática superficial e irresponsável.
4 – Contracultura e Modernismo no Brasil
Todos nós sabemos que “o subdesenvolvimento não é uma etapa do desenvolvimento, mas uma conseqüência dele”[8], que o mundo desenvolvido tornou-se rico e industrializado graças à miséria do Terceiro Mundo. Por isto, o Brasil e a América Latina não podem ser pensados senão a partir da relação de dependência que mantêm com o capital americano e europeu. Mas sabemos também que a história da nossa dependência supõe, além da dominação econômica, a dominação cultural. E que, invariavelmente, qualquer movimento cultural que surja nas nações industrializadas, cedo ou tarde chega ao Brasil, mesmo que aqui chegue desfigurado, caricato e sem os fundamentos sócio-políticos que o originaram. Este também é o caso da contracultura.
O Brasil desde cedo consumiu, principalmente através do cinema e da TV, a história e algumas manifestações da contracultura americana e européia. Mas para entendermos isto, precisamos antes nos reportar ao aparecimento do Modernismo no Brasil., fazendo uma breve resenha histórica até o aparecimento da contracultura.
O Modernismo é a introjeção consciente da Modernidade, projetada em obra. A Modernidade supõe transformações sociais em nível de superestrutura, sem que a infraestrutura de produção seja alterada, apenas o homem passa a viver tais relações de modo novo. De certa forma, a Modernidade é o reflexo do impacto das inovações técnicas sobre a nossa vida, supõe a passagem de uma economia rural a uma urbana, sem que a estrutura de exploração seja alterada. Por isto, Rosenberg chamou a Modernidade de a “tradição do novo”, pois supõe transformações que não se oponham à tradição.
Mas se o Modernismo é a consciência da Modernidade, nós veremos que no Brasil esta consciência não surgiu por uma penetração na nossa realidade, ao contrário. No Brasil a ideologia da mudança foi anterior à própria mudança, o Modernismo anterior em termos à própria Modernidade. Porque, como não somos um país independente, a ideologia não surge do real, mas é trazida de fora e imposta sobre o real. O Modernismo no Brasil foi copiado de fora, apesar de ter conservado nesta cópia elementos novos genuinamente nacionais. E apesar de ter surgido concomitante ao aparecimento de uma burguesia industrial, o que o fundamenta, também aparentemente, na nossa realidade. Mas em verdade, o que aparece mais genuinamente nacional no Modernismo está vinculado a valores agrários e não urbanos. Quisemos mostrar que nos industrializamos, como eles, mas que somos ainda brasileiros.
O Modernismo propõe uma nova relação da arte com a sociedade. E como os movimentos mais representativos do Modernismo (o Surrealismo e o Dadaísmo) trazem à tona as contradições internas da arte, assim fazendo questionam também de algum modo o modelo social existente. Mas após 1945 o Modernismo passa a ser o Concretismo e o Neoconcretismo.
5 – Contracultura e pós-moderno nas artes plásticas
A expressão arte pós-moderna foi usada no Brasil pela primeira vez por Mário Pedrosa, quando referiu-se à arte que surgiu no período da cultura de massa. Anteriormente a isso já se discutia no mundo, a partir de várias teses, a questão do quando teria surgido e como se caracterizaria a idade pós-moderna. Uns situam o seu início no final do século passado, concomitantemente ao surgimento do imperialismo, outros situam-no ao final da Segunda Guerra Mundial e anos 50. E finalmente, Ihab Hassan e Leslie Fiedler, atribuem aos anos 60 o surgimento de uma “nova sensibilidade”, precedida de algumas obras precursoras da década de 50. Inclino-me por esta terceira posição por ver a arte pós-moderna como que marcada por um momento temporal que é essencialmente cultural, ou seja, identifico no surgimento do pós-moderno através da Pop-Art uma expressão inequívoca da influência do movimento da contracultura sobre a concepção de arte. Porém, Jean-François Lyotard não aceita tal conceito como período histórico, vê apenas nele indicativos de um estado de espírito, de uma mudança de sentido.
Foi a partir da concepção de idade pós-moderna que historiadores e sociólogos americanos criaram o termo pós-modernismo, aplicando-o à arte e associando-o ao período da sociedade em que a arte supera a sua separação da técnica esse descobre na construção de um outro sentido, em que a imaginação se expressa no campo das técnicas de comunicação.
A história da arte moderna é um processo de afastamento do real e de destruição do objeto, onde o impressionismo liberta a luz, o fauvismo exalta a cor, o expressionismo e o cubismo deformam e desestruturam o objeto, libertando a forma e levando ao abstracionismo; o surrealismo substitui o objeto exterior pelo “modelo interior”, abrindo caminho ao vanguardismo, em conjunto com a transgressão dadaísta, que rompe com o “objeto-obra-de-arte”. E foi das experiências neovanguardistas que saiu o pós-Modernismo, que a partir da década de 70 se instaura definitivamente como uma atitude definida e uma nova visão. Inverteu-se a tendência de moderno, a partir, como cita annatereza Fabris, da:
“…colagem, assemblage, música aleatória, happening, arte de computadores, body art, arte cinética, arte de processo, arte conceitural, minimalismo, earth art, poesia concreta, objets trouvés e objetos predispostos, esculturas autodestrutivas, absurdas, anormais, modas parciais, fantásticas, descontínuas, lúdicas, formas autoreflexivas.”[9]
Passamos do puro subjetivismo ao puro objetivismo, o hiper-realismo é um exemplo. O concretismo, o neo-concretismo, o futurismo e a optical art foram as experiências de transição. E a pop art é o mais claro exemplo daquilo que é característico do pós-moderno. Como escreveu Fabris:
“Na Idade pós-moderna, o problema da arte não é mais nem menos aquele – moderno – da relação com a produção técnica; é, ao contrário, a constatação de que o novo, o real, a experiência, passam a priori através das grades da comunicação (e que, portanto, não existem mais, em sentido estrito, nem novo, nem real, nem experiência).”[10]
6 – O pop americano e brasileiro
A modernidade está associada a uma concepção cultural da industrialização que produziu movimentos artísticos que valorizam o desenvolvimentoeconômico e os valores de urbanização da sociedade.
São explicitações do Modernismo o futurismo, o concretismo, o neoconcretismo e a optical art. São movimentos maiores da modernidade o surrealismo, o abstracionismo e o dadaísmo. Entretanto, as vanguardas entraram em crise junto com o moderno, abrindo espaço a uma crítica da modernidade, que encontrará expressões mais ou menos radicais. A arte pop é uma dessas expressões.
Assim como o movimento hippie, apesar de sua origem como movimento de protesto, pode ser analisado como um movimento de burguesia que desviou as atenções da massa das questões cruciais da política. Assim também, a pop arte pode ser vista como um movimento artístico de contestação, quase uma revolução estética, que foi traído por haver em grande parte assumido um papel alienador e não de conscientizador e ativista.
O movimento beat possui pontos de contato com a arte pop, porque ambos são expressões artísticas que andaram paralelas e que comungaram de algumas idéias estéticas. E tanto a literatura beat quanto a arte pop são expressões da contracultura, cada uma a seu modo.
A pop art surgiu simultaneamente nos EUA e na Inglaterra entre 1956 e 1966. Está enraizada na urbanidade das grandes metrópoles, é figurativa e realista, assume como motivo das obras objetos da indústria de bens de consumo e imagens da publicidade, retrtatando-os de forma literal, para espanto do público. Seus principais representantes foram, nos EUA: Andy Warhol, Roy Lichtenstein, Robert Rauschenberg, Jaspers Johns, Claes Oldenburg, James Rosenquist, Billy Al Bengston, Edward Ruscha e Tom Wesselmann. E na Inglaterra: Richard Hamilton, Peter Blaki, Patrick Caufield, David Hockney, Allen Jones, Gerald Laing e Peter Phillips.
Sabemos que a arte pop descobriu o cotidiano, elevando o banal à categoria de arquétipo, fazendo com que o objeto se intrometesse no campo artístico. Jean-Pierre Keller diz que o pop é a passagem da representação à apresentação, em que o objeto mesmo se faz presente como símbolo de si mesmo, como na obra de Marcel Duchamps. Diz ele que De Chirico revelou que nos é estranha a familiaridade das coisas e que Warhol faz com que do banal passemos à imagem e desta ao signo e deste ao objeto mesmo. Escreve, também Oscar Masott, sobre o que pretende o pop:
“…la empresa de traer a primero plano la ’estructura’ pensada como relación entre signos, para llevar a segundo plano la ‘forma’ estendida como tension presente de los vetores y La dinâmica deal campo. El arte pop podría ser definido entonses como um arte no gestáltico de intención semântica.”[11]
Ou seja, o realismo do pop não é o realismo dos objetos ou de um conteúdo explícito, é o que Masotta chama de “realismo de linguagem”, porque o pop põe a nu os códigos sociais do cotidiano, cheios de restrições e proibições. Para ele, o pop tenta “rebaixar” a imagem com o objeto real a que ela (a imagem) se refere.
[1] SANTOS, José Luiz. O que é cultura, São Paulo, Ed. Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, 1983, p. 24.
[2] Ibidem, p. 24-5.
[3] SCHWARTZENBERG, Roger-Gérard. Sociologia Política. São Paulo, Ed. Difel, 1979, pg. 384.
[4] ROSZAK, Theodore. The making of a couter culture. Anchor Books, New York, 1969, pg. 64.
[5] Apud PEREIRA,Carlos Alberto.O que é contracultura?Ed. Brasiliense, Coleção primeiros Passos, São Paulo, pg. 14.
[6] Apud BIVAR, Antonio e outros.Alma Beat.LPM Editores. Porto Alegre, 1984, pg. 164.
[7] VARES,Luiz.”Marcuse: pensador ou profeta”. Zero Hora (jornal), 05/08/1979, Porto Alegre.
[8] GALEANO,Eduardo.As veias abertas da América Latina. Ed. Paz e Terra, 5[ Ed., Rio de Janeiro, 1978.
[9] FABRIS,Annatereza. Notas sobre o pós-moderno. In Arte em São Paulo, número 21, SP, março de 1984.
[10] APUD FABRIS.Annatereza, ibidem.
[11] MASOTTA, Oscar. El pop art.Ed. Columba, Buenos Aires, 1967, pg. 66.