A Impermanência
O princípio budista da impermanência de todas as coisas não é difícil de entender. Afinal, tudo está em constante movimento e transformação, nada é para sempre. Difícil é aceitar que não há vida eterna, alma imortal e um Deus imutável e fora do tempo a nos ajudar ou castigar. Também não é fácil pensar que, no dizer de Heráclito, o ser passa a não ser, que tudo o que é está fadado a deixar de ser; está, como disse Sartre, assediado pelo nada. Se isto é assim, somos e não somos como pensamos que sejamos, a contradição cinge o ser entre parecer e vacuidade, fumaça, ilusão, loucura.
A impermanência sozinha já é uma revolução em nossa concepção de mundo e em nossa maneira de levar a vida. E obviamente, também mexe com nossa concepção arraigada de nós mesmos, levando-nos a admitir a possibilidade de sermos diferentes a cada momento, de termos em nós facetas que não admitiríamos possuir, de nos deixarmos desconfortados conosco mesmos, como se o autoconhecimento fosse um projeto fadado ao insucesso.
Mas a impermanência, apesar do acima exposto, não deve levar-nos ao pessimismo ou à depressão psicológica, pelo contrário. Romper com a ânsia de guardar e manter, com o medo de perder, com o apego, por si só é uma iluminação. É só deixar fluir, surfar na vida, esvaziar-se de toda e qualquer ganância, prepotência e autoilusão. É só abrir-se ao novo, à renovação constante, à mutabilidade, à inovação, de modo a viver cada momento como único, e cada perspectiva como mais uma chance de crescermos como totalidade egoica, de experienciarmos as velhas coisas de modo diferente, de conhecermos pessoas novas, de modo profundamente estimulante, intenso e maravilhoso.
A impermanência é fácil e difícil enquanto se dá ao intelecto, mas apenas é quando se torna vivência e convicção. Do mesmo modo, apenas somos de passagem, ambulantes e transitórios, apreciando a paisagem da viagem pela vida, gozando o sentimento de estar vivo sem medo da morte.